A história do Grupo de Estudos das Artes Cênicas (GEAC)
por Alexandre Meirelles
Em 2017, a XYZ Produções Artísticas, concebeu sob minha coordenação, o Grupo de Estudos das Artes Cênicas - GEAC. A partir de uma “reunião fundadora”, em agosto daquele ano, propusemos a um grupo seleto de atores convidados, um semestre de “experimentações cênicas”. Experimentações concretas e com objetivos específicos. Coisas que tinham a ver com os livros, repertório artístico e pesquisas que chegavam sobre o teatro no mundo, de profissionais como: Laban, Jacques Lecoq, Yoshi Oida, Lee Strasberg, Serguei Tcherkásski, Peter Brook, Grotowski e sua grande referência, o mestre Stanislávski.
Iniciamos esse treinamento nos aproximando de tudo aquilo que tinha a ver com o concreto do teatro, da dialética dos corpos, dos ritmos, do jogo. Mergulhamos no livro de Elena Vássina e Aimar Labaki - Stanislávski - Vida, Obra e Sistema - que continha um primeiro contato de seu pensamento vivo, sua gênese e pesquisa, em textos pela primeira vez traduzidos diretamente do russo para o português. Continuamos desenvolvendo esses conteúdos dentro de uma estrutura dramática para conectá-los com Histórias de Chuva, obra de Milton Morales Filho, dando início aos trabalhos teóricos e práticos sobre a linguagem do realismo fantástico.
Criamos uma rotina com encontros semanais e com cronogramas de trabalho sempre priorizando nosso treinamento corporal, com muitas e variadas dinâmicas (Warm Up, do National Theatre London, Laban exercises, Lecoq com seu corpo poético e a bioenergética de Alexander Lowen, por exemplo). Assim começamos os trabalhos, focados na fisicalidade do teatro, no corpo do ator, nos volumes e sonoridades, buscando sempre o abstrato concreto e uma poética eminentemente teatral.
Experimentávamos exercícios, colocávamos os conhecimentos à disposição, criando aos poucos um entendimento, na prática.
Após a leitura, pesquisas, laboratórios, análise ativa e imersão no universo abordado em Histórias de Chuva, chegamos à conclusão de que a partir daí, talvez, “éramos um grupo de teatro” para contar aquelas histórias. Ou talvez desejássemos ser um grupo de teatro. Ou talvez devamos nos perguntar se, sendo já, aparentemente, um grupo de teatro, queríamos de fato sê-lo.
E demos o título de GEAC - Grupo de Estudos das Artes Cênicas - por falta de outro nome, por ser o óbvio, porque, até então, era a única maneira de caracterizar aquele agrupamento de pessoas.
Estar em um grupo de atores é o que fazemos, o que temos feito. Quando começamos, já éramos, já estávamos sendo. E quando paramos para olhar, de quando em quando, percebemos com surpresa que, continuávamos sendo um grupo de teatro. Decidimos viver o tempo todo pela possibilidade de fazer de novo algo que nos tinha dado prazer, que nos estimulava pelas diferenças, pela criatividade, pela possibilidade de nos colocarmos em jogo.
Desta forma, o espírito organizador, planejador, administrador veio se convidando e participando pela própria história das realizações deste grupo de artistas. E então, numa trajetória colada à vida de todos nós, foi se consolidando que somos produtores, que queremos viabilizar nosso trabalho, que queremos ter condições - e que o merecemos - de poder dar ao trabalho criador a conotação nobre que nunca deveria ter perdido. Que somos veículos da arte, não possuidores, mas veículos da necessidade do homem de se olhar, de contar e ouvir histórias, de correr o risco, de gargalhar de si mesmo, de passar o tempo, de se perguntar, de arriscar respostas, efêmeras como o teatro, para estas perguntas. Foi surgindo algo interessante, o querer criar um espetáculo, mostrá-lo, comunicar, ouvir, aprimorar as habilidades, fazer jus ao que escolhemos como vida; sofisticar, como arte, a produção, a criação, e o ofício do teatro.
Para finalizar, assumimos como pensamento de base da nossa história, que a arte é um ponto de vista, uma maneira de passar o tempo, é escolher a própria vida e seus contrastes e formas como alívio. Não paramos, compulsivos que somos, e chatos, criativos, caretas, modernos, moralistas, libertários, neuróticos, românticos, mimados, debochados, descolados, musicais, desafinados, apaixonados, traiçoeiros, abusados e muito limitados.
Após definir que HISTÓRIAS DE CHUVA, seria a nossa primeira montagem, iniciamos um processo de desejar compartilhar o que estávamos desenvolvendo, realizando uma leitura dramática no final daquele mesmo ano (2017), na Mostra de Leituras e Processos da Casa da Gioconda. Após essa leitura, já em 2018 fomos convidados pelo Colégio Humboldt, escola bilíngue localizada no bairro de Interlagos, na cidade de São Paulo, para apresentar a obra em seu teatro. A intermediação junto ao colégio foi feita por Bastian Thurner que pertence ao corpo docente do colégio e é um dos nossos atores criadores. Ele viabilizou a apresentação do nosso processo para um público de aproximadamente 400 alunos adolescentes, com bate papo no final da apresentação onde recebemos diversos feedbacks que possibilitaram um olhar atento e renovador para o que estávamos realizando.
Com a peça já produzida e montada após a experiência proporcionada pelo Colégio Humboldt participamos da 2ª Mostra de Leituras e Processos da Casa da Gioconda, desta vez com o desafio de trazer para um espaço alternativo o que havíamos apresentado num palco italiano convencional (Colégio Humboldt). Pronto. Assim nasceu uma versão – de fato alternativa – da montagem de Histórias de Chuva, com o público mais próximo das personagens, iluminação, música e cenário mais intimistas, que revelaram uma potencialidade do nosso entendimento do espetáculo cujo feedback do público ao final de cada apresentação era evidente. Enfim, tínhamos em mãos uma obra concebida a partir deste coletivo de artistas que se colocaram à disposição de algo maior – tínhamos um espetáculo para chamarmos de nosso.
Durante todo o ano de 2019, continuamos com os nossos estudos e pesquisas dentro do GEAC, nos reunindo duas vezes por semana durante 3 horas/dia totalizando mais de 200 horas de trabalho. A consciência de que tínhamos em mãos um espetáculo finalizado e que poderíamos continuar seu aprimoramento até conseguirmos mais recursos para tal – tentamos diversos editais, prêmios e festivais sem sucesso – criou um desejo obstinado, persistente e perseverante. Durante todo aquele ano, nos dedicamos a novas experiências, nos abrindo para o conhecimento de estudos cênicos focados para além de Histórias de Chuva, e para o aprimoramento de cada artista criador deste coletivo.
No início de 2020 fomos impactados com a crise global de pandemia e tivemos que ressignificar todo o “modus operandi” do que havia sido feito até então. Respeitando as informações e protocolos exigidos pelos órgãos competentes, decidimos suspender as atividades, para aguardar o melhor momento para retomá-las. Não satisfeito com os resultados de classificação alcançados nos editais e prêmios onde se inscreveu HISTÓRIAS DE CHUVA, tomei a decisão de reformular o projeto reforçando a linguagem do realismo fantástico como fio condutor da pesquisa e inscrevi na Lei Emergencial para a Cultura Aldir Blanc, concedida pelo Governo Federal com verbas administradas pelos estados e municípios, sendo comtemplado, para nossa grata surpresa pelo Prêmio Maria Alice Vergueiro da Secretaria de Cultura da cidade de São Paulo.
Após um período de contemplação e extrema alegria pela conquista de algo tão significativo para o grupo, retomamos o projeto formando uma nova equipe artística de trabalho para nos dar suporte e criar possibilidades de focarmos esta “nova montagem” a partir de uma verticalização na pesquisa sobre o realismo fantástico. Leituras, ensaios teóricos, análise ativa, discussões, gêneses das personagens, trabalhos físicos começaram a partir de um cronograma de trabalho cumprido à risca no modo online, durante todo o ano de 2021 e presencial após o ciclo vacinal completo. As cenas foram levantadas e o espetáculo nasceu sob um novo formato de cenários, figurinos, iluminação e encenação. A pré-estreia ocorreu em 29 de abril de 2022 na Casa da Gioconda e a primeira temporada com 24 sessões ininterruptas, foi realizada com todas as sessões lotadas e gratuitas para a população da cidade de São Paulo.
Formação Original do GEAC (2017 - 2022)
ALEXANDRE SANTOS (até 2019)
ANDERSON ROSA
BASTIAN THURNER
DOUGLAS SÁ
FELIPE GONZALES
FERRUCCIO CORNACCHIA (até 2019)
FREDERICO MENDONÇA
GABRIELLA POTYE
GUSTAVO SANTO (até 2018)
LORA LAZAROVA (até 2019)
MAIRA HELLEN
MARCELA FERROS
MARIANA FALOPPA
MILU VIANNA (até 2019)
SIMONE ÉVANZ
